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domingo, 27 de fevereiro de 2011

Cachoeiras

A cachoeira


Castro Alves

Mas súbito da noite no arrepio

Um mugido soturno rompe as trevas...

Titubantes — no álveo do rio —

Tremem as lapas dos titães coevas!...

Que grito é este sepulcral, bravio,

Que espanta as sombras ululantes, sevas?

É o brado atroador da catadupa

Do penhasco batendo na garupa!...

Quando no lodo fértil das paragens

Onde o Paraguaçu rola profundo,

O vermelho novilho nas pastagens

Come os caniços do torrão fecundo;

Inquieto ele aspira nas bafagens

Da negra sucr'ruiúba o cheiro imundo...

Mas já tarde... silvando o monstro voa...

E o novilho preado os ares troa!

Então doido de dor, sânie babando,

Co'a serpente no dorso parte o touro...

Aos bramidos os vales vão clamando,

Fogem as aves em sentido choro...

Mas súbito ela às águas o arrastando

Contrai-se para o negro sorvedouro...

E enrolando-lhe o corpo quente, exangue,

Quebra-o nas roscas, donde jorra o sangue.

Assim dir-se-ia que a caudal gigante

— Larga sucuruiúba do infinito —

Co'as escamas das ondas coruscante

Ferrara o negro touro de granito!...

Hórrido, insano, triste, lacerante

Sobe do abismo um pavoroso grito...

E medonha a suar a rocha brava

As pontas negras na serpente crava!...

Dilacerado o rio espadanando

Chama as águas da extrema do deserto...

Atropela-se, empina, espuma o bando...

E em massa rui no precipício aberto...

Das grutas nas cavernas estourando

O coro dos trovões travam concerto...

E ao vê-lo as águias tontas, eriçadas

Caem de horror no abismo estateladas...

A cachoeira! Paulo Afonso! O abismo!

A briga colossal dos elementos!

As garras do Centauro em paroxismo

Raspando os flancos dos parcéis sangrentos.

Relutantes na dor do cataclismo

Os braços do gigante suarentos

Agüentando a ranger (espanto! assombro!)

O rio inteiro, que lhe cai do ombro.

Grupo enorme do fero Laocoonte

Viva a Grécia acolá e a luta estranha!...

Do sacerdote o punho e a roxa fronte...

E as serpentes de Tênedos em sanha!...

Por hidra — um rio! Por áugure — um monte!

Por aras de Minerva — uma montanha!

E em torno ao pedestal laçados, tredos,

Como filhos — chorando-lhe — os penedos!!!...


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